A liturgia da Igreja deseja ser um caminho mistagógico, ou seja, um experimentar do mistério divino.
A mistagogia é um recurso pedagógico, o qual vai conduzindo os iniciantes, passo-a-passo nos mistérios da fé e da Igreja, tendo em vista uma caminhada cristã. Assim, para os pais da Igreja, não se trata apenas de conteúdo catequético e doutrinário, tendo em vista a inserção na vida cristã, mas possui um caráter de fundamento teológico, o que possibilita uma penetração cada vez mais nos mistérios celebrados. Esse aprofundamento, junto aos pais da Igreja, se dava pelas celebrações litúrgicas, sempre providas de caráter nobre e catequético, cujo conteúdo formativo, dado pelos ritos, sinais e símbolos, permitia aos participantes e iniciados mergulhar nos mistérios da fé que celebravam[1].
A quaresma é o tempo que antecede a celebração da páscoa e era o tempo no qual os catecúmenos se preparavam para receber o batismo, no sábado santo, tornando-se, assim, cristãos. Por isso, convido você a entrar nesse tempo quaresmal com esse propósito: renovar o seu compromisso batismal, de seguir a Jesus, no sábado santo, vigília pascal. Celebrar a páscoa de Jesus, a vitória da vida sobre a morte, deve-se traduzir na nova vida, que nós cristãos devemos viver pela graça do batismo, morrendo a cada dia para o pecado e ressurgindo com Jesus para essa vida nova, que se tornará plena quando formos para a eternidade. Perceba como que cada evangelho quaresmal é um passo nesse caminho de abraçar ou renovar o compromisso com Jesus.
1º domingo quaresma – Mt 4,1-11. Jesus vai ao deserto ser tentado pelo diabo. A quaresma será o nosso deserto, onde deveremos enfrentar tudo aquilo que nos afasta da fidelidade ao batismo. Jesus venceu as tentações com a Palavra de Deus. A quaresma é tempo de nos colocarmos com mais intensidade diante da Palavra para que ela ilumine as áreas obscuras de nossa vida. Tenhamos a coragem de ir ao deserto, conduzidos pelo Espírito Santo, junto com Jesus, para com Ele sairmos vencedores do pecado.
2º domingo quaresma – Mt 17,1-9. Jesus é transfigurado diante dos discípulos. Se levarmos a sério a proposta de rever a nossa vida, à luz da Palavra, conduzidos pela graça de Deus (Espírito Santo), aos poucos seremos transfigurados, ou seja, o homem velho pecador irá dando lugar ao homem novo, regenerado pela graça divina.
3º domingo quaresma – Jo 4,5-15.19b-26.39a.40-42. Jesus se revela à samaritana como fonte de água viva, ou seja, como portador do Espírito Santo. A vida nova herdada do batismo, não é vivida simplesmente pelas forças humanas, mas é resposta à graça de Deus. É o próprio Deus que, mediante o Espírito Santo, fará com que aos poucos nos assemelhemos a Jesus Cristo seu Filho. Por isso, estejamos dóceis a ação de Deus em nossa vida para que a vida nova de Cristo brote em nós.
4º domingo quaresma – Jo 9,1.6-9.13-17.34-38. Jesus cura o cego de nascença. Na bíblia a cegueira (ausência de luz) é símbolo da falta de fé, em outras palavras, falta de nossa adesão e compromisso com Jesus. Quaresma é tempo de reconhecer que, embora sendo católicos, podemos de fato, não estar sendo cristãos, porque a nossa vida não se assemelha à vida de Jesus. Pensamos enxergar, mas no fundo podemos estar cegos.
5º domingo quaresma – Jo 11,1-45. Jesus revive Lázaro. Lázaro simboliza cada um nós, mortos pelo pecado e que, se ouvirmos a palavra de Jesus, seremos ressuscitados por Ele. Viver a palavra de Jesus já é ressurreição, já é experimentar desde já a vida eterna, ou seja, uma vida de amizade com Deus, que depois será plenificada quando formos para a eternidade.
Cada ano Deus concede “aos cristãos esperar com alegria, a festa da Páscoa. De coração purificado, entregues à oração e à prática do amor fraterno, preparamo-nos para celebrar os mistérios pascais, que nos deram vida nova e nos tornaram filhas e filhos de Deus”[2]. Que esta não seja mais uma quaresma em que não haja mudança em nossa vida. Aproveitemos verdadeiramente esse tempo da graça para que a vida nova e divina plantada em nós no batismo, possa de fato traduzir-se em uma vida santa e semelhante à de Jesus.
Fr. Inácio José, odem